20 de Setembro de 2005
"É frequente encontrarmos o nosso destino nos caminhos que tomámos para o evitar."
Jean de la Fontaine
Acho que, de certa forma foi isso que me aconteceu. Costumo rejeitar com fervor a ideia temerária e absolutista de que o destino está escrito. Não me assustam as linhas que o possam constituir mas a incapacidade do homem de as mudar... Qual seria então o fundamento da nossa vida? Viver unicamente e passivamente o destino que nos foi atribuído é como ser o actor de uma peça que alguém escreveu ou a marioneta controlada por alguém. Que sentido faria a nossa frágil e dissimulada existência?
Coincidência ou não tive exactamente as mesmas notas nos exames nacionais de Biologia e Química: 16,6. E para que esse inexorável destino em que não acredito (ou tento não acreditar!) se cumprisse... não entrei! Não concretizei o sonho que tenho vindo a construit, não pus à prova o projecto que meticulosamente tracei. A minha vida perdeu um pouco de mim mesma, um pouco dela própria. O meu único consolo foi a voz doce e preocupada de quem me deu a notícia... Não me lembro como reagi... inicialmente bem, depois mal. Lembro-me de ter ficado muito contente com a sua entrada em Enfermagem... muito mesmo. Fiquei de rastos o resto da noite... e os dias que se seguiram. Tive óptimos amigos do meu lado! E a eles estarei eternamente grata, independentemente dos diversos caminhos que seguirmos.
Sempre desejei Medicina acima de tudo, mesmo sabendo a luta difícil que teria de travar, contra as notas exigentes, as convenções sociais num país em que os sonhos nos são cruelmente roubados... Mesmo conhecendo a enorme possibilidade de fracassar... tal como aconteceu!
Talveu o meu destino tenha acabado por conseguir apanhar-me... As Letras acabaram por conseguir capturar-me (pois o meu 20 no exame de Português deu-me uma óptima nota de candidatura de 19,05): não, claro, contra a minha vontade. Lembro-me de em pequena dizer que queria ser escritora. Mas hoje as coisas mudaram... continuo a gostar de escrever, embora tenha perdido o enorme interesse de miúda pela escrita de poesia... A prosa dá-me mais liberdade, permite-me muitas mais coisas... Agora gosto apenas de ler poesia: adoro Torga ou Cesário Verde. Apesar de gostar de Letras e de achar que me vou dar, pelo menos, razoavelmente bem nesta área... sei (e esta certeza está bem no meu íntimo, segura de si própria) que não será em Letras que obterei a minha realização. Tenho a absoluta certeza que não... Para já... veremos que água irá correr pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.