Para sonhadores... Deixem-se levar... O blog mudou de cores, mas os sonhos são os mesmos...

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Abr 07

“- Marianita – disse o príncipe depois de um silêncio um pouco longo, olhando fixo as labaredas que as achas da fogueira lançavam no ar.

- Sim?

- Quero que saibas que vos amei. – Voltou para ela o olhar marejado de lágrimas e, depois de engolir em seco, com algum esforço continuou: - No início, era um sentimento paternal. Só poderia sê-lo, senhora! Vós éreis uma catraia! Linda catraia, vos digo eu! Mas a vossa forma de agir e de pensar, depois de crescerdes, e todas as vossas atitudes que eu observei ao longo destes anos fizeram com que me fosse penoso separar-me de vós. O que é isso, senão amor? – De vez em quando olhava pelo canto do olho para ela, tentando perceber que reacção teria. – Agora, que estou a morrer, é que vos digo isto… Deveria tê-lo dito há muito mais tempo. Mas não fui capaz. Pensava que vos queria como a uma filha, agarrei-me a esse pensamento e nunca desejei pensar nele. Nunca pensei que pudesse ser outra coisa.

Quando olhou para D. Mariana, ela vertia grossas lágrimas.

- Devíeis, sim! Devíeis tê-lo dito há muito mais tempo, senhor! – exclamou baixinho.

Eram lágrimas de cansaço e de amargura por todos os anos em que não o soubera. Eram lágrimas de saudade por todas as ocasiões em que desejara sentir que ele era todo seu, e não o sentira. Saudade imensa e intensa de todos esses momentos que dão ânimo para prosseguir com a vida, para saber que se está no caminho certo, sem medos e sem peias e com alguém a apoiar. (…) Quantas vezes ansiara por aquelas palavras tão simples mas tão difíceis de pronunciar quando não são sentidas do fundo do coração? Ela amara-o, idolatrara-o, considerara-o o mais imponente, nobre e ilustre dos homens que conhecera. Tivera algumas desilusões, claro, quem não as tem? Momentos em que ele não fizera o que ela pensava que deveria ser feito, ou momentos em que a ignorara… Mesmo depois de conhecer outras cortes, outros homens, D. Mariana Luísa não mudara a sua opinião, nem o seu modo de sentir em relação a Charles Joseph. Agora ele, no fim da sua vida, vinha confirmar uma ilusão que ela sempre tivera. Durante toda a sua vida, pensara que o amor dele não era mais do que uma ilusão. No final, agora tão próximo, em que a morte viria resgatá-lo, levá-lo e colhê-lo, como a uma espiga que ondula ao vento e é cortada pela foice acerada, agora, no final da vida dele, quando ela já não tinha tempo para desfrutar plenamente desse amor, ele revelava-lhe que essa ilusão era, afinal, a verdade! Que ironia!”

Maria João da Câmara in Um Príncipe Quase Perfeito

publicado por Vânia Caldeira às 21:05
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