Observo os miúdos correndo pela areia completamente despreocupados. E é nesta atenta observação que me apercebo das semelhanças entre a nossa vida, os nossos sonhos e projectos e este meio aparentemente tão calmo e desprovido daquilo que possamos adjectivar de “quotidiano”.
Novo olhar em meu redor... Umas ocupam-se com seriedade e perfeição de arquitecto na construção de ambiciosos castelos; outras preferem a emoção e a adrenalina, “voando” na crista das ondas, hoje definitivamente mais acentuadas do que é costume.
Percebo então, olhando além das ingénuas brincadeiras de criança, estar a ver o meu próprio mundo. A nossa vida são ambiciosos projectos que traçamos e que, com esforço, transformamos em vanguardistas construções. Mas que, dum momento para o outro, tal como os castelos são pisados por outra criança ou destruídos pelas ondas do mar, também a nossa vida se desmorona sem uma única justificação ou um pedido de desculpas...
A nossa vida tem sonhos, metas, objectivos que nos levam a voar alto, ir mais além, sentirmo-nos omnipotentes, qual os pequenos bruscamente elevados pelas ondas do mar... Mas há o voo arriscado e a queda brusca, tal como a vaga que se ergue alta para de seguida bater, com toda a força, novamente na areia. Também nós, depois de sonhar, enfrentamos a dura e cruel realidade. E que realidade é essa? Aquela que algures bem perto, para lá deste paraíso sossegado, deste mar inspirador e deste sol intenso que queima e não deixa ver, há uma selva por desbravar, um mundo de intriga, violência e corrupção, onde os sonhos já quase não são possíveis e onde a nossa condição se resume àquela que foi imortalizada por Camões: um mero “bicho da terra tão pequeno”.