Para sonhadores... Deixem-se levar... O blog mudou de cores, mas os sonhos são os mesmos...

11
Jun 08

 

Vivemos numa verdadeira república das bananas. A expressão é desprovida de toda e qualquer originalidade, mas não deixa de ter a força da verdade. Deixámos de acreditar em possíveis melhorias... O país está de pernas para o ar, num caos completo, a desordem pública impera, o desrespeito é lei e o governo esconde-se atrás das suas decisões (se chega sequer a tomá-las), enquanto o PSD brinca aos partidos.

Depois de os pescadores terem acreditado que podiam chamar a atenção do governo privando o país do seu peixe, tarefa que se revelou em vão (pelo menos para os que mais precisam), surgiu a vez dos camionistas. Como esperado, o efeito foi claramente superior, obtendo uma enorme amplificação em todos os sectores e condicionando inúmeros serviços. Desde já quero deixar bem claro que não tenho nada contra pescadores ou camionistas e que respeito o seu direito de se manisfestarem, de entrarem em greve e, sobretudo, a coragem para o fazer. Mas existem duas coisas que me incomodam. Por um lado, a linha ténue que parece separar essa coragem, essa suposta luta pela sobrevivência, dos contornos animalescos que delimitam a irracionalidade e a violência. Por outro, o facto alarmante de que os camionistas pararam e, com eles, parou o país.

 

O país, esse, foi mais longe e parou em todos os sentidos. Além dos produtos que jazem em inúmeros camiões parados por essas estradas e esses parques de estacionamento fora, a uma só voz, unidos por uma causa, ou por medo dos que nela acreditam, a ordem pública esvaiu-se sem que ninguém desse por nada e, ainda por cima, sem que ninguém se tivesse queixado.

Os camionistas que não vêem sucesso nessa luta, que não acreditam nela ou que simplesmente precisam de continuar a trabalhar para poder subsistir, perderam o direito à segurança da sua viagem. Levantam-se mais cedo, tentam fazer o percurso durante a noite, procuram trajectos alternativos... Mas quando se cruzam inevitavelmente com os grevistas são demovidos a parar, a juntar-se a uma nobre causa comum. A nobreza perde-se nos gestos violentos e irreflectidos, nas persuasões com recurso à força ou às ameaças. Apedrejamento de camiões (entenda-se, estragar os camiões de colegas apenas porque estes não se querem unir à greve) que, hoje, até se estendeu a um camião de medicamentos, incendiamentos, actos de vandalismo... Onde vamos parar?

Entretanto, ontem, aconteceu mais um aparente motivo de revolta e indignação para os camionistas que, agora, dizem ter ainda mais força para lutar. Surpresa? Para mim não. Um dos grevistas foi atropelado fatalmente e contribuiu para manchar de sangue uma guerra que parece não ter tréguas. Quantos mais terão de morrer para acabarem com isto?

Perante a violação do direito de livre circulação e de qualquer segurança nas estradas, onde está o Estado? Porque é que a polícia não está nos locais de greve há mais tempo? Porque é que a ordem pública e o direito de escolha dos restantes camionistas não têm sido assegurados? Com medo de ser apelidado de "fascista", o governo demorou demasiado tempo a tomar a atitude certa: enviar o Corpo de Intervenção da GNR para a estrada para tentar restabelecer alguma da ordem e dos direitos dos cidadãos.

No governo ninguém comenta, ninguém dá a cara... e, pior que tudo o resto, ninguém parece fazer nada! A manutenção dos serviços mínimos deveria ter sido uma prioridade desde o início, mas só ao fim de alguns dias de greve surgiram reduzidas escoltas policiais para assegurar a passagem de alguns camiões. O abastecimento das grandes superfícies comerciais com os bens essenciais pode estar comprometido, o aeroporto da Portela vê as reservas de combustível a diminuirem dramaticamente e as bombas de gasolina mais parecem portagens em hora de ponta. Sim, porque essa é outra ironia curiosa. O gasóleo e a gasolina estão a ser vendidos a preço de ouro, toda a gente (inclusive os ditos grevistas) se queixa do preço dos combustíveis... mas os senhores camionistas conseguiram tratar de subir loucamente as vendas de combustível, de pôr toda a gente doida à procura de uma bomba onde o gasóleo ainda não tivesse esgotado, uma bomba onde abastecer e mais do que o costume para prevenir, não vá isto continuar nos próximos dias.

Não sei se o Governo tem medo, mas sei que é isso que parece. A oposição, essa, nem vê-la. Mas se surgir para dizer barbaridades acerca dos jovens e do trabalho precário (que pelo que percebi deve ser regra, na opinião da dita senhora) mais vale manter-se calada e aproveitar a sua imunidade a essa precariedade, na sua confortável cadeira da idade, em vez de dar lugar aos jovens que se lançam na política.

Impõem-se medidas urgentes para acabar com o caos que o país se tornou, impõe-se uma resposta do primeiro-ministro aos acontecimentos e novas decisões urgem. Mas também se impõe que os grevistas percebam que estão a atacar os "seus", os outros camionistas que querem prosseguir viagem, e a população em geral que precisa de seguir com a vida.

 

 

Perante todas as más notícias, lá vão os portugueses, habituados a conformarem-se com tudo, colocando a sua esperança apenas no que resta... e que já não é muito. A selecção nacional, claro está. Depois de uma empolgante vitória sobre os turcos, o país volta a unir-se de vermelho e verde em torno dos ecrãs, aproveita para beber umas cervejas porque está calor e para, durante 90 minutos de emoção, sobre o relvado verde e de olhos postos nas esperanças das Quinas, nos passes de mágico do Deco, na enorme vontade do Pepe, na perfeição de Ricardo Carvalho ou até nas atitudes mais individualistas do 7, a nação une-se para acreditar que não estamos sempre condenados ao duro e sofrido final que o fado sempre ditou. Não, pelo menos não no futebol.

Também é fantástico ver o apoio que está montado à selecção portuguesa na Suiça. Pelo menos, é bom saber que os emigrantes apesar de terem abandonado o país e mesmo à distância continuam a acreditar nele. Porque para os que cá ficam... não está fácil!

E, já agora, creio que este poema do grande génio português não poderia ser mais aplicável aos difíceis dias que se vivem:

 

 

"Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fátuo encerra.

 

Ninguém sabe que coisa quere.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

 

É a Hora!"

 

Fernando Pessoa, poema "Nevoeiro" in Mensagem

publicado por Vânia Caldeira às 15:00
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